Programa Ecowomen

Solidariedade Intergeracional: o perigo da renúncia da Terra e a Humanidade como organismo único

“‘Vida sustentável é vaidade pessoal”, disse Ailton Krenak. A partir disso, é necessário refletir sobre o significado de sustentabilidade e como atribuímos responsabilidade individual para todas as decisões tomadas em conjunto que, por ventura, deram errado. Hoje, temos campanhas para redução de consumo doméstico de água, canudos de inox, coletores menstruais, talheres de madeira e mais diversos outros itens pertencentes ao mais novo mercado: Eco-Friendly (lê-se “amigo do meio ambiente”). Nesse sentido, uma vez que isso seja verdade, que tipo de amigo somos nós, tendo em vista que, no dia 22 de agosto de 2020 (Global Footprint Network) usamos mais riquezas naturais do que o planeta pode regenerar em um período de um ano? Que vaidade é essa que nos faz pensar que estamos fazendo um favor ao planeta ao reduzir a geração de resíduos quando fomos responsáveis pela produção de 79 milhões de toneladas de resíduos, em 2018, de acordo com a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública – Abrelpe?
Sendo assim, esse conceito utópico de sustentabilidade, em que basta “jogar o lixo no lixo” pra salvar o planeta, é uma tentativa de nos fazer esquecer – intencionalmente – das 250 maiores empresas do mundo que emitem um terço de todos os gases de efeito estufa produzidos pelo homem (Thomson Reuters Financial & Risk, 2017) e de todos as outras grandes indústrias que têm seus lucros alimentados por bilhões de toneladas de água, minérios, petróleo, produtos do agronegócio, entre outros. Com isso, diante de tanta contaminação do ar, solo e água; trabalho análogo à escravidão e pobreza extrema, surge a ideia de escassez.
Segundo definições da Oxford Languages, escassez significa falta de um bem ou serviço necessário; ausência de algo que seja de extrema importância; característica de mesquinho (sentido figurado). Talvez a questão não seja se estamos mesmo vivendo uma escassez ou não, mas sim: Escassez de quê? Paramos de nos preocupar com isso quando renunciamos ao fato de que os seres humanos e a Terra não são duas coisas distintas. Dessa forma, a coexistência é uma condição para a sobrevivência humana e não uma opção, como nossos hábitos fazem parecer. Quando deixamos de reconhecer a natureza como parte da nossa identidade, também apagamos da consciência a responsabilidade de entregar às futuras gerações um planeta habitável, com suas riquezas preservadas.
A verdadeira escassez que vivemos é de solidariedade intergeracional e carência do sentimento de pertencimento. É nesse cenário de deturpação de conceitos que nascem projetos como o Ecowomen, para nos lembrar de como a conexão entre as pessoas em prol da natureza é a chave para alcançar a verdadeira sustentabilidade. Dentro dessa rede de troca de experiências, conhecimentos e desenvolvimento de iniciativas sociais, a Ecofossa, idealizada por Caroline Ribeiro, foi criada como forma de combate à mercantilização do direito ao acesso às necessidades básicas.


Com o objetivo de agregar em um mesmo produto soluções para a destinação correta de resíduos sólidos e a universalização do esgotamento sanitário nas zonas rurais – sem custo para as famílias beneficiárias -, a proposta recria a Fossa Bananeira, com o uso de materiais que, geralmente, são depositados em lixões como pneus, tampas de embalagens plásticas, resíduos de construção civil, entre outros. Aplicando práticas de economia circular, logística reversa e educação ambiental, a Ecofossa é o resultado de uma Engenharia Solidária, que busca unir empresas e pessoas para promover inclusão social através do saneamento básico. Tendo em vista que não existe “jogar fora” – o que é descartado para longe da nossa vista e conforto ainda permanece causando problemas ambientais – e que tudo o que necessitamos já existe, é necessário criar estratégias para transformar os resíduos em matérias-primas, ao passo que mudamos e reduzimos a nossa forma de consumo.
Por isso, além de estar inserida no modelo de empreendedorismo social, a Ecofossa torna mais palpável o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), e configura-se como uma ferramenta pela qual as empresas podem exercer sua responsabilidade socioambiental. Dessa forma, o projeto é um lembrete de que o futuro é aqui e agora e se não agirmos de acordo, não só uma vida sustentável será inalcançável, mas qualquer rastro dela será apagado pela nossa vaidade predatória.

Autor